escrito em 31-10-2007
quarta-feira, 31 de outubro de 2007
A Coca
Coca ou -Jack-o-Lantern_by Toby Ord
Quando menino, a mãe o embalava para dormir. Ficava livre da Coca e o sono chegava manso. Mais tarde, corria das luzes das abóboras nas janelas e jardins. Hoje, no quarto do sanatório, embala o pobre corpo quase destruído e canta baixinho – “Vai-te coca, vai-te coca pra cima do telhado, deixa este menino dormir sossegado.”
escrito em 31-10-2007
terça-feira, 30 de outubro de 2007
Registros
Wash_Away_by_small
O artista-gravador encomendara uma quantidade extra de cera para seu atelier. Os ajudantes estranharam atitude tão dispendiosa. Quando a esposa morreu, o corpo sobre a cama mostrou a pele totalmente impressa. Registrada em água forte, estava ali toda a história dos dias que viveram juntos!
escrito em 27-10-2007
domingo, 28 de outubro de 2007
Demônios

Dia de passeio. A mãe a vestiu de vermelho. Ao chegar à rua, a irmã maldosamente a olhou e, comandando as amiguinhas, correu gritando que aquele diabo não sairia com elas.
Sempre que se sente excluída, garfo afiado na língua, espalha brasas raivosas à volta.
Sempre que se sente excluída, garfo afiado na língua, espalha brasas raivosas à volta.
escrito em 28-10-2007
sexta-feira, 26 de outubro de 2007
Fugindo de quem?

Deixara a cidade grande buscando sossego e segurança.
À primeira notícia de roubo na vizinhança, mudou-se novamente para se proteger da violência. No lugar pacato onde passara a infância, foi agredida até a morte pela empregada que acabara de humilhar.
escrito em 27 setembro de 2007
quinta-feira, 25 de outubro de 2007
Tocaia

Por anos a fio esperou a oportunidade para matá-los. Desde muito jovem engendrara seu plano, passo a passo. Afinal, eles o ignoraram e rejeitaram desde o berço e ainda agora, passavam por ele como se não existisse. Todos os dias, arma no bolso do casaco, ele os espera, escondido numa curva da memória.
escrito em 23-10-2007
terça-feira, 23 de outubro de 2007
Ofélia
A chuva fina caía e tingia a tarde de cinzento embora a grama brilhasse com os tons que o verde teima em mudar quando se despede da luz.
Ela olhava o grande e escuro lago e balançava na grade o corpo incerto entre a promessa verde de mais uma manhã e a entrega às águas profundas, quando presentearia com suas angústias a escuridão definitiva.
Ela olhava o grande e escuro lago e balançava na grade o corpo incerto entre a promessa verde de mais uma manhã e a entrega às águas profundas, quando presentearia com suas angústias a escuridão definitiva.
Escrito em 03-10-07
domingo, 21 de outubro de 2007
Reposição

Sua existência era árida. Velho e mesquinho, o medo de morrer na miséria só lhe trouxe mais pobreza e solidão. Quando o gato, sua única companhia, morreu, derramou-se em lágrimas. Tantas como a chuva que caía lá fora. Teve medo de secar ainda mais. Enterrou o bichano no canto do jardim sob uma fonte. Ali, mãos em concha, avidamente bebia.
escrito em 1º outubro 2007
sexta-feira, 19 de outubro de 2007
A costureira
Trabalhava com prazer, se considerava mansa e despida de agressividade.
Um dia, viu–se com outros olhos.
O tecido, suave e dócil, era dilacerado de um lado a outro pelos cortes de sua tesoura que, sem dó nem piedade, rompia–lhe a trama. Alfinetes e agulhas o espetavam, transpassando a pele. Depois, eram os pontos da máquina como um trem correndo na campina, inclemente e barulhento. E, com que satisfação picotava as franjas nos vestidos! Sim, transformar era muito agressivo.
O tecido, suave e dócil, era dilacerado de um lado a outro pelos cortes de sua tesoura que, sem dó nem piedade, rompia–lhe a trama. Alfinetes e agulhas o espetavam, transpassando a pele. Depois, eram os pontos da máquina como um trem correndo na campina, inclemente e barulhento. E, com que satisfação picotava as franjas nos vestidos! Sim, transformar era muito agressivo.
escrito em 12-10-2007
quarta-feira, 17 de outubro de 2007
Aprendizados
Depois do incêndio aprendeu a desfazer-se de apegos, a tirar o cheiro tóxico das roupas e utensílios que sobraram e ainda como lidar com seguros e maldades humanas. Só não houve quem lhe ensinasse a livrar-se do cinzento amargo que impregnou sua alma.
escrito em 09-10-2007
domingo, 14 de outubro de 2007
Costurando
sábado, 13 de outubro de 2007
sexta-feira, 12 de outubro de 2007
Antevisão

Diariamente, depois da escola, ela subia as escadas do prédio onde ficava o escritório do pai para ajudá-lo. À noite voltavam juntos para casa.
Um dia, ao passar pelo segundo andar, reparou numa porta que nunca tinha observado antes. Era igual às outras, com a diferença de estar aberta e deixar entrever uma discussão entre o senhor do escritório e seu mensageiro. Surpresa e curiosa, parou no vão da escada. Escondida, observou. Em meio à discussão, viu o rapaz bater na cabeça do patrão com o peso de papel, deixando-o ao chão, ensangüentado.
O que viu deixou-a muito aflita e a fez correr escada acima até chegar, ofegante e pálida, à sala do pai pedindo socorro.
Logo desciam todos para encontrar a sala fechada e sem o menor sinal de que ali houvera alguma violência.
Ainda sob choque, a moça insistiu no que havia presenciado, mas acabou por ser levada para descansar, sob a alegação de que estaria tensa, assoberbada pelos estudos.
Dias depois, polícia e repórteres se depararam com o fato descrito pela moça e, graças àquela antevisão, souberam onde buscar o responsável.
Um dia, ao passar pelo segundo andar, reparou numa porta que nunca tinha observado antes. Era igual às outras, com a diferença de estar aberta e deixar entrever uma discussão entre o senhor do escritório e seu mensageiro. Surpresa e curiosa, parou no vão da escada. Escondida, observou. Em meio à discussão, viu o rapaz bater na cabeça do patrão com o peso de papel, deixando-o ao chão, ensangüentado.
O que viu deixou-a muito aflita e a fez correr escada acima até chegar, ofegante e pálida, à sala do pai pedindo socorro.
Logo desciam todos para encontrar a sala fechada e sem o menor sinal de que ali houvera alguma violência.
Ainda sob choque, a moça insistiu no que havia presenciado, mas acabou por ser levada para descansar, sob a alegação de que estaria tensa, assoberbada pelos estudos.
Dias depois, polícia e repórteres se depararam com o fato descrito pela moça e, graças àquela antevisão, souberam onde buscar o responsável.
escrito em 20-09-07
quinta-feira, 11 de outubro de 2007
Batel
Na vida, por muitas vezes, sentia-se como um barco em meio às tempestades.
Os amigos, soube fazê-los tantos, eram como pequenos portos. Em cada um onde ancorava, se abastecia de provisões e coragem para atravessar a borrasca!
escrito em 10-10-2007-para Dulce.
quarta-feira, 10 de outubro de 2007
Arma de guerra

Pelo vão da porta, ela tinha visto a arma do soldado apontada para o pai, enquanto a mãe, nua na cama, chorava e implorava clemência. Depois, tudo ficou rubro, embaçado e muito triste. Mas, ela aprendeu o que fazer quando o pai a despia e chamava para seu quarto.
escrito em 1º-10-07
segunda-feira, 8 de outubro de 2007
A cor do amor
Tinha ciúmes de toda mulher que se aproximava dele. Não fazia cenas, mas achava que todas teriam desejos de conquistá-lo. Após cinqüenta anos de casados, aos seus olhos, ele continuava tão belo e charmoso como quando o conhecera!
escrito em 30-09-07
domingo, 7 de outubro de 2007
As escadas de Jacó
Ascender era sua meta. Desde criança, o brinquedo preferido era saltar “O caracol”, sete degraus que o levariam ao paraíso. Só morava no último andar dos prédios com escadas em espiral, mas nunca havia tido coragem para arriscar-se até o dia em que, embriagado, provocou um incêndio. O prédio em chamas o levou aos infernos.
escrito em 1º-10-2007
sexta-feira, 5 de outubro de 2007
Átropos
Ela havia chegado antes do sol e povoara os sonhos de seu escolhido com horizontes azuis e promessas de abundância. Silenciosa, saíra para a praia deixando-o ainda no leito. Agora, em segredo, tramaria com o mar a borrasca e o naufrágio. Fazia parte de sua natureza trazer surpresa e lágrimas.
Escrito em 03-10-07
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